segunda-feira, agosto 26, 2019

Comentários Eleison: "Pós-modernidade"? - I

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Comentários Eleison – por Dom Williamson
Número DCXXXII (632) - (24 de agosto de 2019)




“PÓS-MODERNIDADE”? – I


Então, quer dizer que estaria ultrapassada a verdade?
Para o homem, perda maior que a dela não pode haver na realidade.

Alguém depara com as palavras “pós-moderno” e “pós-modernidade”, e se pergunta o que significam, ou ao que se referem. Uma suposição razoável é que a palavra “modernidade” se refere ao período da história geral que começou com o final da Segunda Guerra Mundial em 1945, quando a civilização teve de sair das ruínas e dar início a um novo curso. Mas 1945 está agora há quase três quartos de século, e 74 anos é tempo demais para o mundo ter mudado sem evoluir para algo diferente – o mundo está girando a todo instante, “Volvitur orbis”, mas nunca pareceu estar girando mais rápido do que neste nosso século XXI. Portanto, seja lá o que for que tenha mudado, isso é “pós-moderno”.

Fica claro que a questão passa a ser então: no que ele se modificou? E aqui se pôde colocar o coração da "pós-modernidade" em um livro intitulado Culture as religion; the post-modern interpretation of the relationship between culture and religion [A cultura como religião; a interpretação pós-moderna da relação entre cultura e religião], de Wojcieck Niemczewski. Segue um resumo de dois parágrafos de sua tese:

Vivemos em uma época de mudanças de todos os tipos, mas os velhos princípios religiosos e filosóficos colocam freios no progresso, e não se encaixam mais na realidade à nossa volta, que está mudando mais rápido do que nunca. Doravante estamos experimentando a “cultura da escolha”, que envolve todos os elementos culturais que podemos misturar para compor nossa própria visão de mundo. A possibilidade que temos de escolher torna-se então um sinal de liberdade à custa do antigo elemento da verdade, que nos permite permanecer adaptáveis ​​à vida moderna.

Como resultado, essa cultura pós-moderna não impõe nenhuma norma, nenhuma obrigação e nenhuma aplicação à vida. Nem transcende esta vida, porque Deus pode existir, mas somente dentro de nós mesmos, somente dentro de nós; na verdade, Ele depende de nós! O homem pós-moderno quer estar em sintonia com seu tempo, isto é, com o movimento e a mudança. Mas um movimento infindável e uma mudança para o quê? Ele não tem ideia, porque se tornou incapaz de definir para onde está indo. Assim, mesmo que os homens mantenham a Tradição, esta pode ser absorvida por essa nova cultura.

No tempo de Noé – ver Gênesis, VI-IX, especialmente VI, 1-13 –, a humanidade era tão corrupta, que para salvar ainda um número significativo de almas, Deus Todo-Poderoso teve de infligir um castigo mundial que daria pelo menos a uma minoria delas motivação e tempo para fazer um bom ato de contrição. E dado o pecado original, é lógico que somente as intervenções de Deus poderiam, a partir de então, desacelerar ou reverter a inclinação da humanidade pela queda. É claro que a maior dessas intervenções foi a própria Encarnação de Deus, mas “quanto mais alto se está, maior é a queda”, e assim, após quase 2000 anos, era previsível que a condição da humanidade viesse a estar pior do que nunca, se Deus decidisse permitir isso. Ora, Ele claramente (Lc XVIII, 8) escolheu desde a eternidade permitir o desaparecimento quase completo da Igreja de Seu Filho antes do fim do mundo. Então, que forma esse desaparecimento tomará? Hoje vemos isso na descrição de Niemczewski da "nova cultura".

Sua descrição nos convida a distinguir entre “moderno” e “pós-moderno”, do seguinte modo: "moderno" seria a cultura global do niilismo, sobretudo depois da Segunda Guerra Mundial: corações e mentes vazios de qualquer convicção, crença, esperança ou confiança, mas os corações e mentes ainda não se desintegraram, e ainda há uma dolorosa sensação do que se perdeu. Pelo contrário, “pós-moderno” seria a consequência lógica dessa dor, ou seja, a autodestruição dos restos de coração e de mente pela vontade, para que não se sinta mais a dor. Eu deliberadamente renuncio à verdade para que minha mente flutue em um jardim de lótus de adoráveis ​​mentiras das quais já não estou consciente de que são mentiras, e meu coração encontra-se à deriva em uma terra de sonhos de desejos ilusórios onde tudo é suave e doce, e sempre o será.

Mas “um fato é mais forte que o Lord Mayor”, diz o provérbio. É verdade que uma multidão de mentes e corações modernos rejeitou todas as amarras e recusou qualquer referência, mas o vento e a maré permanecem como vento e maré. Ora, os inimigos constantes do Deus imutável nunca se esquecem disso, e querem todas as almas reais no inferno real. Ah! Se ao menos os amigos de Deus tivessem tanto senso de realidade quanto eles!

Kyrie eleison.

domingo, agosto 18, 2019

Comentários Eleison: A Voz do Povo - II

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Comentários Eleison – por Dom Williamson
Número DCXXXI (631) - (17 de agosto de 2019)


A Voz do Povo - II

O diabo, em cada combate que é humano verdadeiramente,
A Deus enfrenta, para condenar todas as almas definitivamente.


A entrevista que o presidente Putin deu ao Financial Times em junho, parcialmente resumida e citada aqui na semana passada, tornou-se notória por sua profecia de que "a ideia liberal" já chegou ao seu fim e está obsoleta, o que causou impacto nos políticos e na grande mídia ocidentais. Estes reagiram vigorosamente, como formigas cujo formigueiro foi atingido por um pedaço de pau. Qual é o significado de sua profecia e da reação ocidental a ela? Devemos começar com um resumo do resumo, a fim de esclarecermos o que está no cerne de seu argumento. Na longa entrevista original, ele falou sobre muitos assuntos, mas o que disse sobre o liberalismo foi, de fato, o assunto mais importante que abordou.

O presidente parte do problema prático dos povos ocidentais referente à imigração em massa de estrangeiros inassimiláveis em seus países. No que se refere ao local, o multiculturalismo simplesmente não funciona, porém o liberalismo das elites que lideram o Ocidente faz com que elas tratem a imigração não como um problema, mas como um avanço iluminado, de modo que não fazem nada para impedi-la, e continua sem controle. Mas os estados não podem sobreviver sem algumas regras humanas básicas e sem os valores morais, que foram formados no Ocidente pela Bíblia. Com o desprezo das elites liberais por esses valores bíblicos que ainda se mantêm entre os povos, os liberais estão provando que seu liberalismo não está mais em contato com a realidade, e se tornou obsoleto. Que o antiliberalismo não se transforme, por sua vez, em uma tirania, mas o presente domínio dos liberais sobre a política e os meios de comunicação ocidentais é uma verdadeira tirania, e deve chegar ao fim.

Resumindo, os valores liberais opõem-se aos valores bíblicos. Os valores bíblicos construíram as nações ocidentais. Os valores liberais estão destruindo essas nações. É hora de os valores liberais pararem de destruir o Ocidente. Aqui Putin tem toda a razão quanto ao que diz, mas como é um político, e não um teólogo, não pode expressar o argumento com toda a força, e tem de fundamentar seu argumento não em absolutos como o Deus Todo-Poderoso e Seus Dez Mandamentos, mas na presença de valores bíblicos entre os povos do Ocidente. Ora, os setenta anos de sofrimento agudo sob o comunismo judaico estão trazendo o povo russo de volta ao Cristo da Ortodoxia, de modo que Putin pode apoiar seu caso no retorno de seu povo aos valores bíblicos: mas existe algo de Cristo na resistência do povo ocidental à imigração em massa? Dificilmente. E, no entanto, há uma participação decisiva dos inimigos de Cristo na organização e no financiamento da imigração em massa. (Os leitores destes “Comentários” podem-se lembrar da judia Barbara Spectre na Suécia, quando se vangloria de que seu povo estava por trás da imigração, “necessária para salvar a Europa” – ou, entenda-se, de Cristo).

Assim, se Putin apoia seu caso em relação às nações ocidentais em sua fidelidade aos valores bíblicos, quem pode negar que estes estão sendo erodidos cada vez mais rapidamente? – Obrigado, Senhor Presidente, por querer-nos defender, mas, sinceramente, sua defesa não nos interessa. Nós amamos o nosso liberalismo porque nos dá liberdade para pecar do jeito que quisermos. Você está tentando-nos salvar de nós mesmos, mas nós adoramos Mamon (dinheiro), e adoramos nossa liberdade, igualdade e fraternidade. Nós escolhemos ir para o inferno. Por favor, deixe-nos em paz. Levamos séculos para livrar-nos de Deus, e não o queremos de volta. Essa é a reação implícita, senão explícita, do Ocidente à abordagem política de Putin. Ele precisa de apóstolos de fogo que exponham o caso religioso em seus termos mais absolutos:

Deus existe, imutável desde toda a eternidade. Ele escolheu livremente criar criaturas espirituais, anjos e homens, com uma terra material, de modo a ter seres para participarem de sua bem-aventurança infinita. Mas Ele não quer robôs em Seu Céu, então toda criatura espiritual teve ou tem de usar seu livre-arbítrio para escolher passar a eternidade com Ele no Céu ao invés de passá-la sem Ele no Inferno. No entanto, um terço dos anjos e o casal humano original escolheram o Inferno. Ele preparou uma raça para fornecer um berço humano para que Seu Filho divino assumisse a natureza humana a fim de reparar essa Queda. Essa raça crucificou Seu Filho e tem combatido desde então a Igreja que Seu Filho instituiu para continuar salvando almas até o fim do mundo. Essa luta é uma guerra cósmica, a força impulsora dos acontecimentos mundiais.

Kyrie eleison.

quarta-feira, agosto 14, 2019

Comentários Eleison: A Voz do Povo - I

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Comentários Eleison – por Dom Williamson
Número DCXXX (630) - (10 de agosto de 2019)



A Voz do Povo - I


O líder russo confia na voz do povo –
Mas o que o povo quer é da Vontade de Deus?

Acessem en.kremlin.ru/events/president/news/copy/60836 para assistirem a uma notável entrevista do Presidente Putin realizada em junho deste ano, parcialmente resumida aqui abaixo. Vejam nestes “Comentários” na próxima semana um comentário sobre ela.

O que está acontecendo no Ocidente?... na Europa também? As elites dominantes romperam com o povo, por causa da distância entre os interesses delas e os da imensa maioria do povo... Isso significa que o liberalismo sobreviveu ao seu propósito, porque, como nossos parceiros ocidentais admitiram, as ideias liberais, como o multiculturalismo, provaram não ser mais sustentáveis.

Quando a enxurrada de migrantes para a Europa Ocidental levou o problema da migração a um ponto crítico, muitas pessoas admitiram que a política do multiculturalismo não é efetiva, e que os interesses da população principal deveriam ser considerados... Talvez com um muro entre o México e os Estados Unidos se poderia estar indo longe demais... mas o presidente Trump esteve pelo menos em busca de uma solução. De outro modo, quem está fazendo alguma coisa?... Os americanos comuns dizem: “que bom pra ele, pelo menos ele está trabalhando em ideias e buscando soluções”.

Em contrapartida, os liberais não estão fazendo nada. Sentados em seus escritórios confortáveis, dizem que está tudo bem, mas aqueles que estão enfrentando a situação todos os dias nas ruas do Texas ou da Flórida não estão contentes, porque veem que têm sérios problemas pela frente... Alguém está pensando nessa gente? O mesmo está acontecendo na Europa. Eu tenho discutido isso com muitos dos meus colegas, mas ninguém tem a resposta. Eles dizem que as leis atuais excluem uma política linha-dura... Pois bem, mudem a lei! Na Rússia estamos fazendo os imigrantes respeitarem as leis, os costumes e a cultura da Rússia; então na Rússia também temos problemas de imigração, mas pelo menos estamos fazendo algo a respeito.

Os liberais, pelo contrário, assumem que não há nada que se possa fazer... Os imigrantes podem matar, saquear e estuprar impunemente, porque seus direitos como imigrantes devem ser protegidos. Que direitos são esses? Todo crime deve ter seu castigo. De fato, o liberalismo tornou-se obsoleto. Entrou em conflito com os interesses da imensa maioria da população. Em nome do liberalismo, alguém pode reivindicar, por exemplo... que as crianças podem desempenhar cinco ou seis papéis de gênero... mas a todos os que buscam a vida, a liberdade e a felicidade, tal como o veem, não se deve permitir que dominem a cultura, as tradições e os valores familiares tradicionais de milhões de pessoas que constituem a grande parte da população.

Quanto à religião, ela não pode ser expulsa desse espaço cultural. Nós não devemos abusar de nada. A Rússia é uma nação cristã ortodoxa, e não é uma nação católica, mas na Rússia às vezes temos a sensação de que o mesmo liberalismo está em marcha, usando elementos e problemas da própria Igreja Católica Romana para destruí-la... Considero isso incorreto e perigoso. Esquecemos que todos nós vivemos em um mundo baseado em valores bíblicos? Até os ateus, que vivem neste mundo, se beneficiam desses valores. Pode ser que nem todos sejamos praticantes diários ou públicos de nossa religião particular, mas lá no fundo deve haver algumas regras humanas fundamentais e alguns valores morais. Nesse sentido, os valores tradicionais são mais estáveis ​​e mais importantes para milhões de pessoas do que o liberalismo, que, em minha opinião, está chegando ao fim.

Então, se o liberalismo acabou, isso significa que a tirania está a caminho? Não necessariamente. Uma certa variedade de opiniões deve ter sempre espaço livre. O que importa é que os interesses do público em geral, milhões de pessoas que vivem suas vidas diárias, nunca sejam esquecidos... Assim, mesmo os liberais devem ser tratados com certo respeito, mas os liberais não podem continuar ditando para todo mundo como têm feito nas últimas décadas, tanto nos meios de comunicação quanto na vida real. Por exemplo, como eles colocaram certos assuntos fora dos limites? Deixemos os liberais tenham voz, mas que não dominem em absoluto a pública.

Kyrie eleison.

segunda-feira, agosto 05, 2019

Comentários Eleison: Unidade da Resistência

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Comentários Eleison – por Dom Williamson
Número DCXXIX (629)- (3 de agosto de 2019)


Unidade da Resistência


A Verdade não pode sobreviver sem a Autoridade.
Nenhuma Autoridade pode prosperar sem a Verdade.


Com o propósito de apontar um extintor de incêndios para o orgulho, estes “Comentários” raramente optam por destacar qualquer conquista dos sacerdotes e leigos que trabalham desde 2012 para assegurar a sobrevivência dos princípios e práticas católicos, especialmente, mas não exclusivamente, dentro da Neofraternidade Sacerdotal São Pio X, ou seja, daquela Fraternidade que está deslizando para os braços de Roma. Os líderes da Neofraternidade naturalmente condenam o movimento chamado “Resistência” ou “Fidelidade”, destacando em particular as divisões que surgiram entre seus vários sacerdotes. Mas chegou a hora de dar um destaque à unidade contrastante da "Resistência" católica.

Por exemplo, um observador de longa data da cena da “Resistência” faz as seguintes observações pertinentes: O principal argumento dos Superiores da Neofraternidade contra a “Resistência” é apontar para as divisões entre os sacerdotes resistentes. Mas enquanto vários sacerdotes resistentes têm uma variedade de dons vocacionais dando origem a uma variedade de obras resistentes (por exemplo, um convento, um seminário, um mosteiro, um priorado, uma missão, etc.), reina entre todos eles uma unidade notável quanto ao fim que se persegue: a sobrevivência da fé católica. Pelo contrário, a Neofraternidade é um gigante com pés de barro, unidos somente pelas medidas disciplinares, pelo medo de sanções e pelas posições pessoais, mas quanto ao fim que se persegue está muito dividido: um acordo com Roma, ou não; matrimônios sob a autoridade oficial, ou não; flerte com bispos conciliares, ou não; a Neofraternidade está rachando em todas as direções.

Mais uma vez, o que estamos vendo hoje é como todos os católicos, sem exceção, estão minados pela divisão entre a Verdade Católica e a Autoridade Católica que resultou da traição consciente ou inconsciente dos 2000 Bispos e dois Papas que criaram o Vaticano II. Assim, em 2019, por um lado, a “Resistência” que sustenta a Verdade sofre divisões pela falta de Autoridade, porque a necessidade de autoridade não pode, desde baixo, criar sua realidade, porque a autoridade, por definição, só pode vir de cima. Por outro lado, a Neofraternidade que se sustenta na Autoridade Romana sofre divisão interna pela falta de Verdade, porque essa Autoridade Romana se aferra às mentiras do Vaticano II.

Mas a verdade é o propósito da Autoridade, e não o contrário. “Pedro, uma vez convertido, confirma os teus irmãos” (Lc. XXII, 32). Em outras palavras, em primeiro lugar recupere sua própria fé abalada na Verdade, e depois, em segundo lugar, exerça sua Autoridade sobre os outros apóstolos. Isso ocorre porque, em um mundo caído, a Verdade interior precisa da Autoridade externa para defendê-la, mas se a Autoridade externa não está mais defendendo essa Verdade interna, então ela perdeu sua verdadeira razão de ser, e se torna um fim em si mesma. Em última instância uma tirania para servir a posturas pessoais, como com Paulo VI e os sucessores do Arcebispo.

Assim, por mais abundantes que sejam as misérias pessoais de cada um dos Resistentes, enquanto eles forem fiéis à Verdade, a "Resistência" sobreviverá à Neofraternidade, assim como a Fraternidade do Arcebispo, enquanto foi fiel à Verdade, dominou e, em última instância, sobreviverá aos conciliares romanos. O problema último não é das pessoas ou da Autoridade, mas das doutrinas e da Verdade. Assim, quando no início dos anos 2000 o sucessor do Arcebispo apelou para a Autoridade para que resolvesse as divisões dentro da Fraternidade, ele já se encontrava no caminho conciliar de preferir a Autoridade à Verdade, de preferir a vontade à razão. Como resultado, a Fraternidade do Arcebispo se tornou uma tirania, e, embora o tirano aparentemente tenha sido destituído de seu cargo de poder pela eleição de um ano atrás, ele realmente está de volta ali. É assim que as coisas são em nosso mundo moderno: as aparências não correspondem à realidade.

Kyrie eleison.