segunda-feira, maio 23, 2016

Comentários Eleison: Sentimentos Cristãos

Comentários Eleison - por Dom Williamson
CDLXI (461) - (14 de maio de 2016)
Sentimentos Cristãos

Cristo mostrou que sofrer é um dom precioso.
Para as almas abatidas, eis aqui uma exaltação dada por Deus.

Como pode ter ocorrido ao Papa Bento que Deus Pai tivesse sido cruel com Deus Filho ao fazê-lo pagar pelos pecados do mundo (cf. CE da semana passada)? “Um batismo tenho para batizar-me”, disse o próprio Filho, “e como me angustio até que venha a cumprir-se” (Lc. XII,50). Santa Teresa de Ávila quis “sofrer ou morrer”, mas Santa Maria Madalena de Pazzi quis “sofrer e não morrer”. A seguinte citação apresenta aquela compreensão cristã sobre o sofrimento da qual carece o moderno Bento:

A quem posso contar o que estou sofrendo? A ninguém nesta terra, porque não é um sofrimento desta terra, e ninguém no mundo entenderia. O sofrimento é uma doce espécie de dor e uma dolorosa espécie de doçura. Queria sofrer dez vezes, cem vezes mais. Por nada no mundo eu gostaria que parasse. Isto ainda não significa que não esteja sofrendo. Sofro como se estivesse sendo agarrada pela garganta, oprimida pelas faces de uma prensa, queimada em um forno, perfurada no próprio coração.

Se eu pudesse me mover, estar por minha conta e risco, de modo que pudesse me mover e cantar para dar vazão ao que estou sentindo por dentro, porque a dor é realmente sentida, seria um alívio. Mas estou cravada como Jesus na Cruz. Não posso nem me mover, nem estar por minha própria conta, e tenho de morder minha língua para não satisfazer a curiosidade das pessoas em relação à minha doce agonia. Morder minha língua é pouco. Somente com grande esforço posso controlar o impulso de deixar sair o pranto da dor e da alegria sobrenatural que brota dentro e quer queimar com toda a força de uma chama abrasadora ou da água que sai aos borbotões.

A face de Jesus, sombreada de dor quando Pilatos o mostrou à multidão, atrai-me como o espetáculo de algum desastre. Ele está diante de mim e me olha, de pé sobre as escadas do Pretório, sua cabeça coroada de espinhos, suas mãos atadas diante da vestimenta de idiota que lhe foi dada por Herodes para ridicularizá-lo, mas, em verdade, vestindo-o de um branco que corresponde à sua perfeita Inocência. Ele nada diz, mas tudo n’Ele está falando, chamando-me, pedindo-me algo.

Para quê? Ele está me pedindo que o ame. Sei que é isso, e dou-lhe até que me sinto morrer com uma espada transpassando meu peito. Mas Ele ainda me pede algo que não compreendo. E queria compreender. Não entender é uma tortura para mim. Desejaria poder dar-lhe tudo o que quer, mesmo se tivesse de padecer uma morte agonizante. E ainda não posso lhe dar isto.

Seu rosto, cheio de dor, atrai-me e fascina-me. Ele é tão belo quando é o Mestre ou quando é Ressuscitado da morte. Mas vê-lo me enche simplesmente de alegria, enquanto vê-lo em dor me enche de um amor incomensurável, inigualável mesmo ao cuidado de uma mãe por sua criatura que sofre.

Sim, compreendo realmente que o amor compassivo é a crucificação da criatura que segue seu Mestre por todo o caminho até a tormenta final. É um amor tirânico, que bloqueia todo pensamento que não seja o da Sua dor. Já não pertencemos a nós mesmos. Vivemos somente para consolar a Sua tortura, e esta é nossa tormenta, a que literalmente nos mata. E, sem embargo, cada lágrima que derramamos pela dor é mais cara que uma pérola de grande valor, e cada dor Sua na qual podemos entrar é mais ambicionada que qualquer tesouro.

Padre, tentei contar-lhe o que estou padecendo, mas tento em vão. Entre todas as visões que Deus me deu, contemplar Seu sofrimento será sempre o que leva minha alma ao sétimo céu. Morrer de amor enquanto se contempla seu sofrimento – que morte poderia ser mais bela?

Kyrie eleison.


Nota do blog: Sobre Valtorta, recomendamos a seguinte leitura: http://borboletasaoluar.blogspot.com.br/2016/04/respostas-acusacoes-levantadas_29.html